quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

COMO COMECEI A TOCAR GUITARRA

Lembro que eu procurava por endereços de clínicas médicas especializadas em transplantes, quando topei com um artigo interessante que descrevia de forma resumida a prática do escambo na sociedade moderna.
Eu tinha esse pulmão e estava disposto a vendê-lo por uma quantia módica. Fiz algumas buscas na internet e encontrei um cara numa vila de Marrakesh, com uma criancinha latino-americana, linda, uma menininha de nome Angélica e tenros oito anos de idade.
Rapidamente fizemos o rolo, desfiz-me de um pulmão praticamente intacto e fiquei com a garotinha.

Seguimos para o oriente, torrando minha grana com balas e sorvetes.
Meses depois, durante uma viagem de barco pelo Oceano Indico, conheci essa senhora, ela possuía uma velha casa num bairro decadente de Paris, tratava-se de uma propriedade muito velha, no entanto, havia um piano, não entendo muito de piano, mas pela fotografia que me foi mostrada na época, parecia ser dos bons.
Fizemos o rolo ali mesmo, no barco, cercados por aquela imensidão levemente esverdeada do oceano.
A velha levou a menina e eu fiquei com um pedaço de papel indicando o caminho e a pessoa que deveria procurar em Paris.

Recém chegado à capital francesa toquei a campainha do endereço rabiscado no papel, um sujeitinho corcunda atendeu a porta. Em menos de quinze minutos fizemos um acordo.
Entreguei-lhe um olho de vidro e ele ajudou a carregar o piano até o porto de Brest de onde embarquei num vôo fretado até Maracaibo.

Encontrei Paco Juarez num campeonato de pesca, domingo de manhã. Paco andava ligado em jazz e cocaína 24 horas por dia, parecia uma versão gorducha de Jack Kerouac. Acabou ficando com a piano, nem foi preciso insistir muito, apanhei Guarantama, uma indiazinha paraguaia que vivia com Paco em Lima.
Voamos para a Indonésia no dia seguinte. Guarantama e eu – éramos um casal e fomos felizes durante um tempo. Até conhecer Annavirra, a Stratocaster de Lúcio-boca-de-litro e foi assim que me despedi de Guarantama, sem poder, no entanto, segurar as lágrimas, empunhando minha Fender vermelha enquanto aquele pequeno barco pesqueiro se afastava da orla provocando pequenas ondas dentro da minha cabeça que transbordava em notas musicais dissonantes da realidade que eu tinha vivido até aquele momento.
E foi assim que comecei a tocar nas noites de Adelaide.