sexta-feira, 24 de agosto de 2007

O CAMINHO DE CONCEPCIÓN - III

Até o dia em que nos proibiram de colocar os pés outra vez na loja de conveniência do posto. Era uma tarde nublada de quinta-feira, estávamos nós três lá, de frente pro mar, sentindo o vento gelado da praia de Juarez.
Enrolei um cigarro de palha, andava com essa mania já fazia um tempo, acendi.
- Precisamos arrumar um outro trampo pro Neguinho – comentei.
- Tenho uma entrevista na semana que vem, se quiser pode ir no meu lugar – o Serginho falou.
- Naquela fábrica de enlatados? Nem ferrando.
- Quanto tão pagando? – perguntei.
- 400 paus.
- Merreca.
- Melhor que nada.
- Prefiro ficar olhando pro mar – o Neguinho comentou, enquanto quebrava uns gravetos.
E foi o que fizemos, nós três entardecendo junto com a praia de San Juarez, onde quase ninguém circulava. Estávamos em silêncio, como que à espera de alguma coisa que não podíamos antever ou evitar. Sabíamos de antemão que a qualquer momento pegaríamos a estrada novamente. Tínhamos desenvolvido uma forma de intuição para essas coisas.
Uma brisa melancólica batia no meu rosto.
- Lembra daquela vez que compramos fumo daquele cara lá em Constança? – o Serginho perguntou pro Neguinho.
- Já tinha até esquecido.
- Passamos a noite toda nessa praia, só que mais ali, pra frente – indicou com a cabeça enquanto dava uns tragos no meu cigarro.
Tinha um cara que vendia erva escondida dentro de bolas de tênis, e tanto em Juarez quanto em Constança, quase todo mundo andava treinando com raquetes improvisadas. Um dia o Serginho e o Neguinho tinham comprado a tal erva, escondida dentro de uma daquelas bolas de tênis, porém o que não desconfiavam , era de que a polícia já sabia do truque, quando viu que tava num mato sem cachorro, o cara começou a vender os “ovos de páscoa” sem o recheio.
- Lembro que ficamos jogando aquela bola rasgada de um para o outro, até quase amanhecer – o Neguinho comentou.
- Deve ter sido um barato.
- Foi decepcionante.
Vimos um barco de pesca a uns 200 metros de distância, o Serginho começou a gritar e gesticular para ele. O Gustavo apareceu pouco depois, num Corcel caindo aos pedaços. Nisso já tava anoitecendo. Juntamos todo o dinheiro que tínhamos. Dava pra comprar duas garrafas de vinho barato.
Compramos as garrafas e pegamos a estrada outra vez, seguindo uma placa verde desbotada que indicava a distância exata de onde estávamos até a cidade de Constança. Viramos os últimos goles do vinho na saída de Juarez.
Finalmente estávamos no caminho de Concepción.