O raro caso da menina que encolheu não era raro coisa nenhuma, afinal de contas, uma porção de outras personagens já havia encolhido antes, em contos criados em todos os lugares do mundo.
Então ela vinha, toda pequenininha gritando: - VEJA SÓ MÃE, ENCOLHI!
- Ora, deixa de besteira – sua mãe respondia – Tanta gente já encolheu antes, isso não é nenhuma novidade – e ela voltava triste para dentro da sua caixa de sapatos que temporariamente virara uma cama improvisada.
Mas acontece que um dia, enquanto varria o chão da casa, distraidamente sua mãe acabou empurrando-a com a vassoura para a pá de lixo, junto com a sujeira acumulada de dez dias e ela nem teve tempo de gritar nem nada, pois estava no sétimo sono, dentro daquela minúscula caixa de sapatos infantis.
Acordou pouco depois, com o barulho de um cachorro que revirava a lata de lixo onde ela agora se encontrava. A sorte era que o cachorro tinha um temperamento bastante amistoso, embora gostasse de revirar lixo não tinha tendência a maldades, como é típico dos bichos, tirando o bicho-homem, é claro. Logo ficaram grandes amigos e a meninazinha andava agarrada na orelha do Messias (como ela gostava de chamar seu novo amigo) para baixo e para cima, como se fosse um brinco falante. E a mãe que notara a falta da filha colocou um anúncio na parede da padaria, e ao cheiro das rosquinhas que saiam do forno todos os dias pontualmente as duas da tarde misturavam-se agora, aquelas palavras: PROCURA-SE MENINHAZINHA ENCOLHIDA. E a meninazinha, no prazo de sete dias, viveu uma aventura como nunca antes tinha sido contada em nenhuma mitologia ou conto de fadas, sua estória era tão incrivelmente fascinante e repleta de reviravoltas que se eu contar aqui vou ficar três dias e três noites escrevendo e não tenho muito tempo, preciso dar um pulo lá fora, comprar leite para o gato persa da Bruna e tenho certeza de que vou ler aquele anuncio que colocaram ontem mesmo na parede da padaria: ENCONTROU-SE MENINAZINHA ENCOLHIDA, MÃE ETERNAMENTE AGRADECIDA ÀS SANTAS ROSQUINHAS DO MEIO DIA.
Pois dizem que a menina chegou em casa tarde da noite, toda molhada de chuva e suja de lama dos pés a cabeça, agarrada à orelha de um cachorro igualmente sujo, cujo rabo abanava como se fosse a hélice de um helicóptero. E agora, se você passar na frente daquela casa onde até dois dias atrás, vivia uma mulher solitária a lamentar a ausência da filhinha querida, verá que colocaram uma casa de cachorro novinha em folha, cujo dono atual, Messias, vive a fazer xixi nas paredes - e no lixo, com certeza você não ira encontrar rastro de meninazinha encolhida algum, a lata que a essa altura do campeonato, dada a inconstância do Messias, já deve estar devidamente tombada, guardará uma minúscula caixa de sapatos antiga, pois essa foi trocada por uma caixinha nova, onde repousa agora, a menina que encolheu, provavelmente sonhando com aquelas estórias todas de lama, chuva e um rabo que girava freneticamente e ainda gira, gira, gira, gira.......